A poesia de Chico chegou antes dele pra mim. Até hoje guardo uma fita cassete de áudio que minha mãe gravou. Ela dizia, na gravação, com uma voz distorcida de equipamento antigo: "Denise, com 3 anos". Aí, entre pausas (para respirar ou para chamar a atenção da mamãe, como: "Manhê, tô de bota!"), eu cantava, com uma voz de bebê afinada: "Pai, afasta de mim esse cálice... de vinho TANTO de sangue." Naquela época, o vinho tinto não existia pra mim, por isso eu substituía "tinto" por "tanto". E seguia cantando, sem saber que já engrossava o côro de fãs de Chico Buarque. Na ingenuidade de meu timbre infantil, dava voz ao hino contra a ditadura.
Sempre que ouço à fita me emociono.
Depois Chico voltou a aparecer, no musical Os Saltimbancos. Eu adorava a música dos gatos, mas eu nem sabia que era dele.
O nome "Chico Buarque" eu li aos 9 anos, numa partitura. Eu já fazia aulas de piano desde os 7, mas me entediava com os exercícios que a professora clássica passava: Bach, Bethoven e outros de difícil compreensão para uma menina da minha idade. Até que Beatriz, a professora, me apresentou o autor de "Beatriz", mas com outra preciosidade: "Valsinha". Descobri um piano que não conhecia, aprendi que podia tocar enquanto cantava. Percebi que de bemóis e sustenidos poderia nascer, das teclas, uma música parecida comigo. E eu imaginava toda aquela história do homem que chegou diferente, a mulher apaixonada, o casal que tinha os rostos dos meus pais... e o dia amanhecendo em paz na pracinha da cidade onde meus pais nasceram.
É por isso que hoje é um dia muito especial pra mim: vou ver o Chico no Tom Brasil! E para beber, pedirei uma taça de vinho tinto.
D
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To nas nuvens ate agora. Acho que vou de novo, vc se anima?
bjs
D